Ainda te sonho por vezes. nas noites em que me permito lembrar-te. Sonho-te a percorrer a cidade que um dia foi nossa, e que já mal recordo. Já faz quase um ano desde que nos perdíamos nessas ruas, noite fora, a falar de tudo e de nada. Corríamos de mãos entrelaçadas por becos, escondidos de um mundo que nos gritava que não éramos um do outro.
Tinha razão, o mundo. Nunca foste meu, da mesma forma que nunca fui tua. Pertencemos-nos por segundos, por vezes, em gélidas noites de inverno, talvez por algumas horas. Mas nunca fomos um do outro, nunca fora dos nossos corações. Talvez, desconfio hoje, também nunca o tenhamos sido no teu. No meu, certamente.
Tudo é diferente agora. A vida continuou a correr, e nós não ficamos parados a vê-la. A tua cidade já não é a minha, os teus caminhos já não são os meus. Já não me percorres todas as linhas de pensamento, todos os dias, a todos os momentos. Já não te sinto em cada entrelinha de todas as músicas que oiço no carro, ou em cada parágrafo das linhas que escrevo.
Por vezes, nas noites mais frias - como a de hoje - ainda cá estás. Ainda me recordo do teu cheiro, tão teu. Ainda pareço sentir o toque dos teus lábios, primeiro a medo, depois como quem nunca me queria largar. Mas, cruelmente e sem dó, tão depressa me recordo de como nos deixaste morrer, sem sequer olhar para trás - ou para mim - uma última vez - e sei que já não te vejo como te vi, ou como talvez te imaginei.
Podia dizer que gostava de saber como estás, e com quem caminhas agora à noite, se estás feliz e se ainda manténs esse sorriso que tanto me ofuscava. Mas não, gostava apenas de esquecer que ainda me fazes falta, por vezes, e que ainda penso em ti, cada dia menos - espero que um dia para nunca mais.